Eram tão amigos, tão inseparáveis, que decidiram morar juntos. Não
na mesmac asa,
num condomínio de casas. Compraram um grande terreno e cada um dos quatro casais
construiu sua casa. Nenhuma ficava a menos de 30 metros da outra e a grande
área verde era comum às quatro. Ali, Paulo e
Marta Helena, Zé Carlos e Titina, Alex e Flávia, Marino e Júlia continuariam fazendo o que sempre faziam, o
que gostavam de fazer, o que os mantinha unidos.Conviveriam.
Reuniriam-se ora na casa de um, ora na casa de outro. Fariam jantares― sempre só os oito ― todas as semanas. Jogariam.
Vôlei: homens contra mulheres, ou times mistos (os que preferiam o Paul
McCartney contra e os que preferiam o John Lennon, por exemplo; eram os
anos 60) Mímica. "War".Cartas.
Tinham todos mais ou menos a mesma idade. Não tinham filhos. Quando viessem os filhos, eles seriam criados ali, no
condomínio.
Cresceriam juntos e seriam amigos como os pais eram amigos. Aquela amizade nunca acabaria.Amigos para sempre. Na inauguração oficial do condomínio, com os oito reunidos no centro do gramado compartilhado pelas quatro casas, os oito com copos de champanhe erguidos, o Paulo disse exatamente isso:― Amigos, para sempre.― Amigos para sempre ― disseram todos.Paulo disse mais. Disse:― Que a nossa vida seja sempre assim. Que nada mude. Que nunca nos separemos!― Que nunca nos separemos!Trinta anos depois, Alex convenceu a Júlia, com quem tinha se casado depois do divórcio dela e do Marino, a visitar o local. Júlia resistira. O Alex tinha aquelas manias. Era um sentimental. Ela preferia não ser lembrada do passado. Mas o Alex insistira e agora ali estavam eles, no meio da grama alta, do capim que quase chegava aos seus joelhos, olhando em volta, olhando as três casas ainda de pé e o que restara da quarta casa depois do incêndio."Que horror" disse a Júlia.Só uma das casas estava ocupada e seu dono obviamente não se preocupava em conservá-la, ou em cuidar do terreno.
A
churrasqueira, que também era compartilhada pelo condomínio, estava coberta por
vegetação selvagem. Um solitário espeto enferrujado jazias obre lajotas rachadas como uma arma deixada para
trás depois de uma batalha perdida."Lembra?" disse Alex."Anrã" disse Júlia, desanimada. Era ali,
na churrasqueira comum, num ensolarado domingo
de manhã, na absurda briga do Paulo e do Zé Carlos, por nada, por um mal-entendido
bobo, que a mágica começara a se desfazer. O fato do Paulo estar endividado e daTitina
estar traindo o Zé Carlos com o Marino não ajudara, apesar do consenso de que o
Zé Carlos sabia de tudo e não se importava e
que o Paulo, sempre metido a grande coisa,merecia a ruína.Também fora ali, atrás da churrasqueira, que Alex
e Júlia tinham começado seu namoro escondido. "Incrível",
disse Alex, pensando na rapidez com que aquela amizade que duraria para sempre
se desfizera. Culminando no episódio dos foguetes, a briga entre Pauloe Marta
Helena e Zé Carlos e Titina porque o filho dos primeiros tinha passado no
vestibular e o Zé Carlos Júnior não, os
foguetes comprados para comemorar a vitória do Júnior atirados contra a casa de Paulo e Marta Helena
porque estes festejavam a vitória do filho acintosamente, para
humilhá-los.
O
incêndio da casa de Paulo e Marta Helena, o processo, a orelha do Zé Carlos
quase arrancada pela Marta Helena, e tudo o que se seguira. Incrível.― Você
acha que a convivência humana é um inferno, Júlia?― Vamos embora, Alex.Ou: Paulo ergue o seu
copo de champanhe no meio do gramado e diz.― Amigos para sempre.Todos:― Amigos para sempre!Paulo:― Que
nossa vida seja sempre assim. Que nada mude. Que nunca nos separemos!― Que
nunca nos separemos! Neste momento,
algo acontece. Um raio atinge o copo erguido do Paulo. Há uma reversão de pólos magnéticos. Qualquer coisa
assim. E 30 anos depois os quatro casais continuam os mesmos. Ainda vivem no
condomínio e ainda têm a mesma idade. Nada mudou. Os oito usam as roupas
e os penteados dos anos 60.Quando se visitam, o que é freqüente, as mulheres
vão de minissaias ou "hot pants",os homens de cabelos compridos e
calças apertadas com boca-de-sino.
O condomínio se transforma numa curiosidade, as pessoas vêm de
longe para ver aquele fenômeno, a vida de oito amigos eternizados. Os oito fingem
que não notam as pessoas espiando através da cerca, os
helicópteros sobrevoando suas casas, e o fato de que nenhum deles
envelhece ou muda de hábitos, ou consegue sair do condomínio. Com sua amizade salva do tempo, serão
amigos para sempre, para sempre. Um inferno.Desculpa Na semana passada incluí o cômico Ankito numa lista de pessoas
quem andavam e-mails do além. Não sei se o Ankito usa e-mail mas do além não é:
vários leitores me avisaram que ele
continua vivo e ativo. Espero que continue assim por muito tempo, e me
desculpe.Tchau Estou, como se vê, precisando de férias. Vou
tirá-las. Volto a mandar crônica(do além ou daqui mesmo) no dia 22 de junho.
Até lá, tchau.
Nenhum comentário:
Postar um comentário